quinta-feira, 27 de setembro de 2007

ambulatório médico









hoje eu fui ao hospital

não, desta vez não fui acompanhar alguém
fui por mim mesmo
naquele corredor branco
o médico ridiculamente vestido de branco
e serenos olhos azuis

e óculos caindo no nariz
e ele pegou na minha doença
e eu notei que não sou de vidro
e ele foi humano

e ele me mandou tomar cuidado com as mulheres
pois elas querem me esquartejar
para que eu não dance mais


com outra.



à vista


bebo a cerveja
e olho as tábuas do assoalho
deste velho casarão
em plena Cayru
que ninguém mais quer
que ninguém conhece
ou sabe o nome da Fonte
nem que ela e Cravo tem algo em comum
o Jorge, o cacau, as velas de saveiro
fatigadas
sangrentas navalhadas na rampa
na ponteira
meia-lua de compasso
no calço
no fumo de corda
nos cabos de tração
de amarração em terra firme
ou em ferros frios
nos telhados da montanha
que me servem de orgia
em antigos gozos e cartas
um royal flush
um blefe
um tiro
um sorriso de puta
uma cachaça bem curtida
um adeus
um barco
um dia
sem noite
se me avizinha.



o problema não é a mão
mas de quem é o pulso
o fator Rh, a assinatura, cpf e rg
é de quem sai a grana pro café
de quem sai a cerveja, o pileque, a droga
o azeite que não chega pra tanto acará
e cada acará(jé) não chega pra tanta gente
com fome
com sede e desejo de gente
que fala mal de mim
de ti
dos anjos e dos demônios
não chega pra cada gringo
pra cada argola de ouro
pra cada pernada, meia-lua, arrependido
macaco pulando aú
esbraveja e espuma a boca
cheia de sangue
a gola vermelha
degola de peixe
cabeço de amarração
bata o pandeiro, meu filho
que a noite já chega.
natimorta

Serena puta







eu quero a mão dessa mulher
eu quero essa mão de puta
na minha carne
nos meus sonhos
no meu delírio cotidiano
de homem-problema
com minhas diretrizes
e minhas atrizes
meu morfema
meu anteparo e antepasto
de capim, de notas musicais
meu salvaguardo e sinal flutuante
nesse mar de enjôos
e de sedentas mazelas
onde me molham
gotas de champagne e bourbon
e cachaças baratas
infusão de folhas
e um acarajé cheio
de pimenta
num olhar perdido
com vontade de comê-lo

como se come uma puta.









segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Tabu ou Esmalte Vermelho




Línguas de fogo
vermelho-vivo

fogo intermitente
meu olho não desgruda
não aquieta
afoga-se de calor
nesse trejeito de mão
nesse doido tiritar
dos dedos
- compridos tentáculos -
de ventosas rútilas
incandescentes
e indecentes
elas prendem-me
agarram-me pelos membros, pelos ombros
envolvem-me

e pelas costas
ferem-me a carne

em cortes vivos de brasa
em laivos de desejo.